segunda-feira, 24 de junho de 2013

Choque cultural

Estávamos as duas, eu e a preta, encostadas a uma parede qualquer do bairro alto, de copo não e a jogar conversa fora. Nisto, passa uma outra preta, muito feia e muito gorda, com uns calções de ganga 3 números abaixo do tamanho dela, o que permitia apreciar o gingar de 30 Kg de celulite em cada perna. Diz-me a preta em tom crítico: admiro a coragem destas mulheres da minha raça... e ao mesmo tempo tenho vergonha. Pus-lhe a mão no ombro e disse-lhe: é por causa de coisas como esta que os pretos agora andam a comer brancas. És mesmo estúpida, respondeu ela. É, sou, mas consigo dizer coisas deveras engraçadas. E assim se dá o mote para um momento de reflexão sobre algumas coisas estranhas da raça dela. Porque eu estou, neste momento, a passar pela fase pós-traumática da primeira evidência do choque cultural do casal multi-racial. Não, não tive o jantar oficial de apresentação onde fui obrigada a falar com pessoas com nomes como Arionilson, Gilson, Leonilde ou Ludmila. Nem tive de comer moamba com doses cavalares de picante até lançar torpedos pelo cu. Nem fui obrigada a dançar kizomba com um qualquer tio barrigudo a cheirar a catinga. O choque aconteceu de surpresa na sexta feira à noite. O preto tinha ido a uma festa de pretos, a branca tinha ido a concerto de música de brancos. Terminados os dois eventos, combinaram encontrar-se à porta de casa dela para depois celebrarem o amor. O que a branca nunca pensou é que assim como ela se vestiu a preceito para o evento a que ia, ele tinha feito o mesmo. Sem mais delongas, apresento-vos o choque:

- Então, gostosa? (este podia ser o choque, mas ela assistiu a novelas brasileiras com pretos tesudos desde a infância)
- Oi... (branca dá último bafo no cigarro, deita fora a beata, o que a obriga a olhar para o chão) O que é essa merda?!
- O quê?
- Nos teus pés!!!
- Os meus sapatos bicudos de pele de crocodilo?

Não, filho. Não. Na terra dos brancos isso não são sapatos, são armas de destruição maciça de famílias inteiras de baratas nos cantos da sala. E pele de crocodilo? A sério? Vens mais alguma vez com essa merda de casca de osga para o pé de mim e bem que podes voltar para as kizombadas com as Ludmilas e as Leonildes que eu não quero saber! E ficas já a saber que não gosto de ténis do basket, nem de fatos de linho branco, nem de jóias de família nos dedos todos, nem T-shirts tamanho XXL, nem de gajos que ouvem kuduro no telemóvel aos altos berros para a rua toda ouvir, nem que me chamem dama, nem vou ter 5 filhos!!! Gosto de ter as coisas bem esclarecidas.

terça-feira, 18 de junho de 2013

A dúvida consome-me

Tenho mudanças para fazer. Pessoas que já mudaram de casa várias vezes, sabem a trabalheira que isto dá. Investigar o mercado, visitar várias, escolher uma, o entusiasmo da novidade, as saudades esporádicas do passado... É quase como partir para uma pila nova, mas dá mais trabalho. Trabalho esse, que no caso de mudar de casa, não consigo fazer sozinha. E o paralelismo com as pilas podia ficar por aqui, não fosse algumas das ex-pilas da minha vida se terem oferecido para me ajudar a empacotar coisas. Isto inquieta-me. Serão estas ofertas, iniciativas disfarçadas de altruísmo, uma tentativa dissimulada de me ir ao pacote? Terão eles percebido 'montar-me na cama' quando disse 'desmontar a cama'? Estarão eles preocupados com a hipótese de perder definitivamente as coordenadas dos meus aposentos? Saberão eles que as coisas demasiado brancas agora ferem-me a vista mas já não me eclipsam a púbis? Será que eles vão perceber que estas questões não são dúvidas nenhumas, mas que na realidade o que me inquieta é que ainda não sei se prefiro aproveitar-me de cada um deles em dias separados ou juntá-los a todos na mesma tarde para minha diversão? 

sexta-feira, 14 de junho de 2013

A pedido do público e a título de excepção, sai uma pequena história sobre pilas

As mulheres são falsas. Ou pelo menos são mentirosas. As solteiras, então?... Pffffuuuu! Adoro ouvi-las dizer, convictas e firmes, que são mulheres modernas e independentes, que não precisam dos homens para nada, que isto é só sexo e mais nada, que não admitem ser controladas nem serem obrigadas a dar satisfações a ninguém. Adoro mesmo. E adoro mais ainda quando finalmente se encantam pelo dono de uma pila qualquer e de repente é vê-las a ter crises de ansiedade porque ele ainda não perguntou se ela acordou bem disposta, a terem um interesse súbito pela culinária e a renovarem de uma assentada quatro gavetas de roupa interior. É tão simples como isto: as mulheres não o assumem, mas adoram prestar vassalagem. E eu não posso, nem consigo, fugir à minha condição de mulher. Mas isto agora com a crise e tal, não estamos em tempo de andar para aí a fazer jantares pipi cada vez que se dá uma queca. E, graças a Deus, tenho por hábito ir renovando a minha roupa interior em toda a sagrada época de saldos. Ainda assim, a vassalagem está-me no sangue e ao resto da questão não consigo fugir. Posso passar mais incólume que as outras, mas venho aqui assumir: tornei-me numa serviçal do sexo. Mas não vou aqui descrever a arte da anaconda de chocolate nem descrever o estado de dilaceração da minha coisinha. Até porque não sou contorcionista. E mesmo que fosse, não ia ter coragem de encará-la de frente. Acho que ela odeia-me. Só sei que dói. E às vezes dói tanto, que no fim de semana passado decidi fugir para casa de um amigo de infância. O tempo estava uma real bosta, mas eu precisava mesmo era de descansar. Pelo caminho já sentia saudades do preto, mas vimos um lagarto esmagado na auto-estrada, o que me fez ter uma visão do que não consigo ver e saber que estava a fazer o mais correcto. Mas não vou ficar aqui a descrever metáforas com animais esventrados e o estado dos meus órgãos genitais. Vou sim, falar sobre a minha capacidade de trazer o bem à vida das pessoas. Dizia eu que fui passar o fim de semana com um amigo de infância. Daqueles que são quase irmãos, com quem só falamos de merda, com quem fazemos concursos de peidos e com quem um arroto a meio da cerveja é motivo para uma salva de palmas (às mulheres que lêem isto, se não têm amigos assim, a vossa vida é uma merda). Pois que fui passar 3 dias de pura gastronomia e enologia. Com passeios a meio da tarde para dar ar ao fígado. Numa dessas tardes vesti uma mini-saia. Fui à varanda e estava frio. Inteligente como só eu consigo ser, em vez de trocar a saia por umas calças, decidi enfiar umas collants na mala. A meio da tarde o frio nas pernas estava insuportável. Íamos de carro não sei para onde, havia pinheiros por todo o lado. O meu amigo ia falando da relação de longa data que terminou há poucos meses e de como as colegas da ex-namorada agora o tratam abaixo de cão. 'As mulheres são falsas, más e mentirosas', dizia-lhe eu enquanto vestia as collants de forma acrobática com o carro em andamento numa imensa rotunda, com o cuidado de virar o rabo para a janela e não para a cara do meu amigo. 'Por isso é que...' respondia ele ao meu comentário, quando parou subitamente de falar e ficou com cara de quem tinha visto a mãe em cuecas na rua. 'O que foi? Estás a ver o meu rabo pelo espelho do carro, seu badalhoco?', perguntei eu armada em pudica. 'O carro que estava ali parado para entrar na rotunda... são colegas da minha ex...', disse ele cada vez mais pálido. 'Viram-me o rabo, as badalhocas?', disse eu com ar de riso. 'Diz-me que tens roupa interior decente... ou que tens roupa interior, pelo menos... se é que isso faz alguma diferença...', disse ele a desfalecer. 'Tenho, tenho...', disse eu baixinho enquanto pensava no meu diminuto fio dental, nas escoriações que vão até meio das minhas coxas, mais o estado de lagarto esmagado do resto. Tivemos que traçar um plano de emergência. De certeza que, mais cedo ou mais tarde, ele ia ser confrontado com perguntas. Dizer que estava com uma amiga de infância de rabo ao léu dentro do carro em andamento e com um pinhal localizado a menos de 200m da rotunda do crime, não lhe ia servir de nada. Ninguém ia acreditar nessa história. Dizer que tinha feito um engate na noite anterior com uma espanhola que nunca mais irá voltar a portugal pareceu-nos uma desculpa mais credível. Perguntei-lhe agora sobre as consequências do sucedido. Diz ele que nenhuma das colegas da ex-namorada lhe perguntou sobre o misterioso rabo colado ao vidro do carro dele, mas todas têm perguntado se ele não quer ir beber um café uma noite destas. As mulheres sabem reconhecer os estragos de uma grande pila, digo eu. As mulheres são falsas, más e mentirosas, digo eu. O meu amigo ganhou a fama de ter uma anaconda dentro das calças e a culpa é minha, digo eu.

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Snail, a fazer amigas desde 1978 #2

Pausa para café a meio da manhã no trabalho. Colega quarentona agarra numa qualquer revista e comenta em voz alta as gordas de todos artigos. Faz isso à minha frente todos os dias. Nunca tive coragem de lhe dizer que isso me aborrece. Sou boa pessoa. Finjo sempre entusiasmo à medida que ela vai falando e vou comentando em conformidade. Colega fica em estado de choque com esta:

- Já viste isto do Michael Douglas?? Diz que a causa do cancro que teve na garganta foi a prática de sexo oral!!!

- Estás com medo, é? Eu, por causa das coisas, já fui comprar Tantum Verde.

- És tão porquinha, benza-te Deus... Não é isso! Eu é que não sabia que ele era gay e que anda para aí a chupar pilas!

- Olha cá uma coisa... Se aos quarenta e tal anos ainda não sabes que os homens também fazem isso às mulheres, tens uma vida muito triste, sabias...?

terça-feira, 4 de junho de 2013

Ensaio sobre a analepse

Agora:
Ai. Dói. Muito.

16 horas antes:
Psiu. Acorda. Tenho que ir trabalh.... pum-ba... pum-ba... pum-ba.... Opá tá sossegado! Tenho que ir embora... pumba....pumba.... pumba.... pumba... Opá! Pára! Pumba. Pumba. Pumba. Pumba. Oh...Se chagar atrasada 15 minutos ninguém nota, né? PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! 

4 horas antes:
PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA!PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA!PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA!PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! PUMBA! 

2 horas antes:
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1 horas antes:
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1 hora antes:
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1/2 hora antes:
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3 horas antes:
Ai! Pára! Não está certo! Isto não está certo! Nós não podemos fazer isto! Agora era assim, agarravas em mim, passeio e coiso, copos e coiso e pumba?! Assim? Com esta gente toda a ver?! Vamos para minha casa.

4 horas antes:
Vá, pronto... Desisto. Anda lá beber um café, então. Mas tem que ser coisa rápida.